sexta-feira, 11 de fevereiro de 2011

A miséria da esquerda que anda por aí.


Em Portugal, como na Grécia, há, no que se refere à esquerda institucional, um problema adicional particularmente grave, que é o latente estalinismo, que se revelou em todo o seu esplendor, durante o periodo que mediou o anúncio da cimeira da NATO, em Lisboa e a concretização das acções de contestação aos senhores da guerra; como mais à frente se descreverá. Como a desestalinização do PCP nos anos 60 nunca foi feita, dadas as condições de clandestinidade e apersonalidade dominante de Cunhal, os diversos grupos de dissidentes dali saídos foram sempre portadores de uma ganga ideológica e de uma prática autoritária e inquisitorial ainda presente em muitos dos que compõem a esquerda actual; mesmo quando, geracionalmente, não viveram naquele tempo.
Entende-se que a compreensão das insuficiências da esquerda institucional, nomeadamente quanto às características do capitalismo actual, tornarão mais claras as razões das suas atitudes no âmbito dos propósitos deste texto – os eventos de contestação à NATO – e as causas da sua manifesta inoperância, da ineficácia da sua acção, perante as medidas empobrecedoras e repressivas que se abatem sobre a multidão, em Portugal.
Alarguemos, pois os horizontes, na senda de artigos recentes, nomeadamente “Pensar à esquerda, sem vacas sagradas”.

Há um capitalismo global constituido pelas multinacionais, o sistema financeiro e o capital mafioso que cria e enforma as suas próprias instituições regulatórias, todas elas, formalmente, com um âmbito supranacional. Nesse capitalismo global, nesse sistema imperial, não correspondente a um espaço nacional hegemónico, domina uma casta de grandes gestores, banqueiros, detentores de capital especulativo e dos media globais, mandarins e militares de alto coturno.
Este sistema global contém uma hierarquia de burguesias nacionais, com as suas rivalidades e conflitos mas, já não se pode confundir com o sistema primordialmente composto por rivalidades inter-imperialistas, entre burguesias nacionais, com pretensões hegemónicas, como aconteceu, sensivelmente até ao final da Guerra Fria. Contudo, a existência das nações serve, como desde sempre, para dividir os trabalhadores, para alimentar os antagonismos convenientes para beneficiar o capital.
A constituição de um capitalismo global, integrante das nações e, unificando no essencial, as burguesias nacionais num complexo alargado de poder não foi ainda incorporado pela esquerda portuguesa, que continua apenas a actuar contra o seu governo, isolado no seu território. Como aliás as suas congéneres europeias eapesar da (virtual) criação de um Partido da Esquerda Europeia.
Apetece dizer, abaixo os organismos de cúpula, vivam os orgasmos de cópula, memorável frase escrita nas paredes de Lisboa durante o Prec. Acontece que há muito o poder económico tomou conta do poder político; e como esse poder económico é global, o poder político nacional é a agência local do capitalismo global, do império. É, particularmente claro, no momento presente, o escasso poder do governo português, de Sócrates ou do seu sósia Passos, meros robots dos “mercados” e das tutelas do BCE, da Comissão Europeia, do FMI, da comissária Merkel. E, consequentemente, não está presente na prática da esquerda social-democrata – como na das esquerdas institucionais europeias – uma visão internacionalista da luta social e política, que dê prioridade à unidade dos povos europeus contra o capital. Há mesmo quem procure (PC) aliciar, explicitamente, os trabalhadores para um patriotismo ridículo, serôdio, enganador e suicida.


Retirado do artigo: "A miséria da esquerda que anda por aí"

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