quarta-feira, 23 de janeiro de 2008

Um pouco de história (2ª parte)


Em 1914, contudo, a Primeira Guerra Mundial interrompe a circulação, retomada em 1921. A marcha, porém, tornou-se mais lenta devido às dificuldades decorrentes do conflito. A Guerra Civil de Espanha impõe novas restrições às ligações ferroviárias. Vivem-se tempos de crise na Europa e os comboios sofrem alterações constantes nos seus trajectos.De veículo privilegiado de cultura, o Sud-Express passa então a assegurar uma nova função: a de meio de fuga de cidadãos perseguidos rumo à liberdade. Ivette Davidoff tem hoje 86 anos e vive em Lisboa. Nascida no seio de uma família judaica de Viena, foge em Março de 1938 da capital austríaca e da ameaça nazi rumo a Paris, onde se instala com a mãe e o cão pincher. Aí vivem durante algum tempo com o tio paterno e a esposa deste. Porém, a 11 de Junho de 1940, são obrigados a partir de novo “no último Sud-Express que saía de Austerlitz” e que, devido à guerra, só seguia até Bordéus. “Era o pesadelo da partida”, recorda. “Passámos dois dias e duas noites na estação, até que o meu tio conseguiu um lugar num compartimento”. O comboio estava apinhado. “As pessoas amontoavam-se por todo o lado, até havia gente a viajar no tejadilho”. Durante dois anos, a família permanece em Pau, “na França livre, mais longe dos alemães”, onde pensava “poder esperar pelo fim da guerra, mas os alemães tinham tomado o Sul de França”. Mãe e filha são obrigadas a fugir novamente. Desta vez dirigem-se a Madrid. O tio e a tia ficam para trás. A capital espanhola está repleta de refugiados. “Era preciso seguir para Lisboa, onde havia amigos”. Mas não resta dinheiro suficiente às duas foragidas. É então que surge na vida de Ivette o ‘anjo’ que recordará para sempre, sob a forma de um funcionário da Wagons-Lits. “A minha mãe propôs-lhe um anel de brilhantes. Mas ele disse: ‘Não, senhora, não me vai dar nada. Vou dar-lhe um bilhete e um compartimento com cama’. Deu-nos também o jantar”. É assim que Ivette e a mãe desembarcam em Lisboa naquele longínquo ano de 1943, escapando ao campo de concentração que teria sido o seu destino. O homem que lhes salvou a vida quis ficar anónimo. Nunca mais o viu.

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