segunda-feira, 3 de janeiro de 2011

Crise do euro corre o risco de se arrastar em 2011


A dúvida nas capitais europeias já não é saber se Portugal recorrerá ao fundo de socorro do euro, mas quando é que o irá fazer.

A apreensão sobre o futuro do euro com que a União Europeia (UE) entra em 2011 é quase a mesma com que começou o ano passado, apesar de ter criado desde então um mecanismo de socorro dos países em dificuldades que era ainda há pouco considerado impensável. Há um ano, a preocupação dos 16 países do euro era suscitada sobretudo pela Grécia, que se encontrava sob o fogo dos mercados financeiros desconfiados sobre a sua capacidade de reembolsar uma dívida pública abissal alimentada por um défice orçamental galopante. Agora, é sobretudo Portugal, e de certo modo a Espanha, que está a suscitar o nervosismo dos investidores. De tal forma que a expectativa em quase todas as capitais europeias é que mal os mercados retomem o seu ritmo normal nas primeiras semanas de 2011, a pressão sobre os títulos de dívida portugueses volte a provocar um aumento dos juros, obrigando Portugal a pedir a ajuda do fundo de estabilidade do euro (EFSF na sigla inglesa) que foi criado em Maio para fornecer liquidez aos países em dificuldades. A Irlanda, cujo défice público disparou em resultado da garantia ilimitada do Estado aos bancos falidos, viu-se obrigada a recorrer ao EFSF em Novembro. A dúvida, agora, já não é saber se Portugal fará o mesmo, mas quando. Para a generalidade dos grandes economistas internacionais, como Paul Krugman, Nouriel Roubini ou Daniel Gros, e mesmo Strauss-Kahn, director-geral do FMI, o arrastamento da crise da dívida da zona euro em 2010 resultou sobretudo das respostas fragmentadas e casuísticas dos seus membros, que deram muitas vezes uma imagem de desorientação e desunião. Para muitos, igualmente, a criação do EFSF não resolveu nenhum problema de fundo, limitando-se a permitir à eurolândia ganhar tempo. O mesmo aconteceu com o fundo permanente que será criado depois de concluído o período de vigência do EFSF, em 2013, e cujos contornos serão objecto de uma alteração do Tratado de Lisboa a acordar até Março. Esperando mascarar o desacordo interno sobre a melhor resposta para a crise, os líderes da UE avisaram em Dezembro os mercados que farão "tudo o que for necessário" para garantir a estabilidade do euro. Já o tinham dito em Fevereiro, sem conseguirem travar a especulação contra o euro. É por isso que nada permite prever que 2011 será muito diferente de 2010, em que os líderes dedicaram sete cimeiras à crise da dívida. A menos que os 17 membros do euro - a Estónia aderiu ontem - percebam finalmente que a crise só se resolverá com respostas bem mais profundas e ambiciosas do que as actualmente acordadas. A França e a Alemanha deram no final de Dezembro sinais de quererem avançar para uma nova coordenação das políticas económicas, cujas diferenças estão na base de muitos dos problemas estruturais da zona euro, a começar pelas disparidades de competitividade. Os dois países deram como exemplo algum tipo de harmonização fiscal e de políticas sociais, como a idade da reforma. Este poderá ser o sinal de aproximação das teses tradicionalmente antagónicas de Paris e Berlim, que estiveram em confronto na criação do euro e ressuscitaram com a crise da dívida. A Alemanha aceitou o euro na condição de que fosse tão estável como o marco, com uma inflação baixa, um BCE independente, uma rigorosa disciplina orçamental, a proibição do socorro dos governos endividados e a exclusão dos países tradicionalmente mais indisciplinados, na altura conhecidos por "Club Med" e actualmente por PIGS. A França, que queria uma moeda única para amarrar a Alemanha unificada à Europa, defendia uma moeda mais fraca para estimular as exportações, gerida de forma mais flexível pelo poder político no quadro de um Governo económico agindo como contrapeso do BCE, e com a inclusão do "Club Med", de cultura mais próxima da sua. Até agora, foram as teses alemãs que prevaleceram tanto na criação do euro, como nas respostas à crise. Para muitos, o euro só poderá ser salvo se os 17 aceitarem uma aproximação à concepção francesa do "Governo económico" europeu.

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