sexta-feira, 27 de abril de 2012

Mercados e preconceitos.


"Os mercados podem manter-se mais tempo irracionais do que você consegue manter-se solvente". A mensagem é de John Maynard Keynes que a aprendeu por experiência própria.
"Os mercados podem manter-se mais tempo irracionais do que você consegue manter-se solvente". A mensagem é de John Maynard Keynes que a aprendeu por experiência própria.

Vem esta citação a propósito da recente evolução das taxas de juro da dívida pública portuguesa que o ministro de Estado e das Finanças referiu ontem na Assembleia da República para suportar a ideia de que "o ponto de viragem da crise é indesmentível pelos factos".

E os factos são uma acentuada descida da taxas de juro implícita nos títulos da dívida pública portuguesa em praticamente todas as maturidades. Uma evolução a revelar que os investidores estão a comprar mais do que a vender dívida pública portuguesa.

Um dos casos que merece especial atenção é o da taxa de juro associada à dívida que tem de ser paga em Setembro de 2013 (obrigações do Tesouro com maturidade de dois anos). As taxas seguem uma tendência decrescente há duas semanas e ontem estavam pouco acima dos 8%. Que significado se pode retirar disso? Que os investidores estão convencidos que, de uma maneira ou outra, Portugal será capaz de pagar esse empréstimo. Ou consegue financiar-se no mercado ou terá acesso a um novo empréstimo internacional, porque nessa altura já se esgotou o financiamento da troika.

Podemos estar descansados? Nem por isso. Esta tendência decrescente dos juros já se tinha observado em finais do ano passado e bastou, em Janeiro, o "Wall Street Journal" e o "Financial Times" escreverem artigos que apontavam para a possibilidade de Portugal seguir as pisadas da Grécia para os juros iniciarem uma nova fase de alta.

A irracionalidade dos investidores também se revela nesta hipersensibilidade a análises prospectivas que são mais sustentadas em opiniões que, por sua vez, são alimentadas por preconceitos que alguns aproveitam para ganhar dinheiro. Ainda esta semana ficámos a saber que o Morgan Stanley está a apostar na reestruturação da dívida portuguesa e, ao mesmo tempo, diz que Portugal vai reestruturar. Ganha - ou tenta ganhar - influenciando a realidade, pelo poder que tem em fazer acontecer as suas profecias.

Se os mercados fossem racionais, se olhassem apenas para os números que caracterizam uma economia, Portugal teria hoje, no mínimo, uma taxa de juro na sua dívida pública (em mercado secundário) igual à irlandesa. A economia portuguesa está menos endividada, Portugal tem conseguido privatizar e continua a financiar-se nos mercados com emissões de curto prazo - o que não acontece com a Irlanda.

Ah, contra-argumenta-se, mas acontece que a economia irlandesa cresceu no passado e Portugal teve duas décadas medíocres. Os mercados acreditam que o Tigre Celta vai regressar, dizem. Muito bem, todos esperamos que assim seja. Mas os argumentos de irracionalidade que se aplicam à Irlanda também são válidos quando se olha, por exemplo, para a França.

O sucesso de Portugal, na aplicação do programa da troika, depende desta confiança que os mercados dão à Irlanda. Irracional não é investir na Irlanda, irracional é não investir em Portugal, revelando mais preconceito que racionalidade.

Os périplos de Vítor Gaspar no exterior e as mensagens positivas, mas realistas, são um contributo para evitar a insolvência pela irracionalidade dos investidores. Mas todos sabem que não chega, que é apenas uma condição necessária para chegar ao crescimento da economia.

Artigo de: Helena Garrido

1 comentário:

Manuel Veiga disse...

abraço,

gostei de ler o artigo.