sexta-feira, 2 de março de 2012

Regredir.


A política de salários baixos e emprego não especializado prevaleceu em Portugal durante muitos anos no passado recente. Serviu para atrair investimentos de mão obra intensiva e dar trabalho a um número cada vez mais elevado de portugueses que se iam libertando de atividades agrícolas, do subemprego ou ainda aqueles que iniciavam uma vida ativa com fracas habilitações.

Foi assim que se desenvolveram atividades ligadas a diferentes sectores, como o têxtil, confeções, calçado, cablagens, etc.

No entanto, não podia ser nossa ambição viver continuadamente com um projeto que se esgotava, a prazo curto, por aparecerem outros países dispostos a substituir-nos nesse papel e com níveis de proteção social baixos.

Cedo verificamos que um país como o nosso, com poucos recursos naturais, teria de assentar o seu modelo económico na capacidade de criar valor através do conhecimento e da inovação. Isso obrigaria a investirmos mais na formação das pessoas, na investigação, na qualificação e reconversão do tipo de mão-de-obra.

Foi o que fizemos. Fez-se um esforço para prolongar a formação e melhorar a qualificação dos portugueses com um maior investimento na escola pública e nos institutos de investigação e os resultados começaram a fazer-se sentir.

Melhoramos os nossos produtos tradicionais acrescentando mais valor, tecnologia e inovação e nalgumas áreas demos saltos significativos no nosso ranking europeu e até mundial. Refiro me aos sectores das energias renováveis e equipamentos industriais conexos, tecnologias de informação, biotecnologias e até eletrónica. Passamos a vender com mais valor incorporado em vez de vender só mão-de-obra.

A nossa competitividade não se pode fazer só pelo lado dos custos de produção mas sobretudo pela introdução na cadeia de mais valor adquirido através da especialização do saber incorporado. Grande transformação estava em marcha não só nos produtos tradicionais mas também em novos produtos e serviços que começamos a exportar.

Hoje assistimos a um recuo. A atual política de austeridade unicamente centrada na consolidação das contas públicas esquece o crescimento e emprego e conduz os jovens, mais bem preparados, ao desemprego e emigração.

Com alterações ao nível das condições do regime laboral assistimos a uma facilitação dos despedimentos num cenário já deprimente de forte desemprego.

Formamos mais e melhor e aproveitamos menos. Voltamos aos salários baixos com maior intensidade produtiva. Recorremos menos a inovação porque não há empenhamento em apoiar os empreendedores. Afastamo-nos do pelotão da frente nas energias renováveis. Damos sinais errados sobre os incentivos as novas tecnologias e clusters inovadores. Acabaram as Novas Oportunidades sem balanço e sem nada em sua substituição

Em suma, desincentiva-se a formação porque está condenada ao desemprego e não se fomentam as atividades mais dinâmicas que nos conduzem a uma especialização protetora da concorrência.

Regredimos. Voltamos aos salários baixos, com trabalhadores mais qualificados, com mais dias de produção, mais fácil despedir, mas sem trabalho e cada vez com menos procura agregada.

Para onde vamos se cada vez estamos pior?

Crónica de: Fernando Serrasqueiro

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