Depois dos cortes nos salários e subsídios, os médicos confrontam-se agora com contratos de prestação de serviços mal pagos que levaram ao limite a indignação da classe. O bastonário diz que a greve era inevitável. E irreversível.
Há ano e meio à frente da Ordem dos Médicos, José Manuel Silva, 52 anos, tem assumido a primeira linha da contestação às políticas do Governo no sector da Saúde. Acusa o actual elenco de estar a tomar "decisões particularmente gravosas" que põem em causa o Serviço Nacional de Saúde. E aliou-se aos sindicatos na mobilização para a greve de dois dias na próxima semana, a primeira em muitos anos no sector. A paciência, avisa, esgotou-se.
Por que decidiu a Ordem dos Médicos participar activamente na mobilização para a greve da próxima semana?
Perante a decisão dos sindicatos, a Ordem poderia alhear-se ou dar atenção ao processo. E nós consideramos que o momento da Saúde em Portugal é tão grave que tínhamos a obrigação de, no cumprimento das funções delegadas pelo Estado, defender a qualidade do Serviço Nacional de Saúde [SNS] e da prestação de cuidados aos doentes.
Mas essa não é uma competência dos sindicatos?
Todas as organizações médicas estão envolvidas e não há nenhuma que não tenha manifestado a sua adesão à greve. A Ordem, por ter uma visibilidade diferente, tem apenas mais impacto público.
O que está a levar hoje ao descontentamento dos médicos?
Penso que as últimas notícias sobre a contratação de enfermeiros e nutricionistas permitem perceber com mais facilidade o que se está a passar, e que é um dos aspectos que motivaram a convocação da greve pelos sindicatos. É apenas um, num total de 19: o primeiro é a defesa do SNS e da qualidade da medicina portuguesa. Mas se contratarmos profissionais de saúde com um vencimento inferior ao de uma empregada doméstica, toda a gente percebe que assim é impossível manter a qualidade do SNS.
Os portugueses já têm dificuldade de acesso aos médicos e estes estão a emigrar. E obviamente que medidas como a desvalorização dos salários só vão aumentar o fluxo migratório dos médicos. Estamos a falar de técnicos altamente especializados, e outros países europeus têm vindo a Portugal activamente contratar médicos portugueses. É um erro estratégico em termos económicos e de saúde. É preciso criar condições aos profissionais de saúde para se fixarem em Portugal e servirem os doentes portugueses. E isto não está a acontecer com este Governo.
Sabe quantos já emigraram?
Não temos estatísticas, mas estão a emigrar às dezenas. E cada vez mais. Os jovens que estão a terminar os cursos começam a procurar activamente vias profissionais na Europa, Estados Unidos, Austrália, Canadá, até para fazerem a especialidade. Esta era uma realidade que não acontecia, excepto em situações pontuais. E agora está-se a transformar numa realidade diária.
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