segunda-feira, 13 de fevereiro de 2012

O homem que não pode ser fez contas.


O homem que não podia ser era saudável e trabalhava há mais de trinta anos. Num dia em que se dedicou a fazer contas, concluiu que ele e a sua família (quatro pessoas) tinham gasto, nos últimos trinta anos, um valor médio diário aproximado a trinta euros por dia, isto é, menos que trezentos e cinquenta mil euros em trinta anos. Sabia que todo o dinheiro gasto pela sua família tinha sido ganho a título de salário e por contrapartida do seu trabalho e da sua mulher.

O homem vivia com a sua família num apartamento de quatro assoalhadas que adquiriu pagando mensalmente uma prestação de duzentos euros durante trinta anos. Tinha também um automóvel que adquiriu da mesma forma e que lhe custou uma prestação mensal de cem euros durante sete anos. Em trinta anos, o homem e a sua mulher pagaram ao Estado, a título de descontos ou impostos, mais de duzentos mil euros. O homem e a sua mulher tinham contratos com as empresas que os empregavam nos quais se estabeleciam os direitos e deveres e o regime de trabalho e respetivas contrapartidas salariais. O homem sabe que a sua família viveu com dificuldades e com a permanente sensação de não ter dinheiro suficiente para garantir a satisfação das necessidades de caráter básico.

Pensava o homem, até há pouco tempo, que a vida tinha sido dura, mas que tinha vivido bem, tinha conseguido honrar os seus compromissos e pagar as suas dívidas. O homem que não podia ser também sabia que muitas famílias de muitos homens que trabalhavam viviam com muito menos recursos que a sua, o que é o mesmo que dizer que viviam com mais dificuldades.

Mas, durante trinta anos, o homem que não podia ser ouviu contar muitas histórias de homens que acumulavam fortunas sem trabalhar. Porém, diz-se agora que todos estão em dívida e que a dívida é tão grande que o homem que não podia ser e os seus filhos e todas as famílias de gente que sempre trabalhou vão ter que trabalhar a vida inteira e isso talvez não chegue para a conseguir pagar. Diz-se também, dizem-no os governantes, que a solução para a atual crise económica passa pela desvalorização do trabalho, isto é, por mais sofrimento para quem trabalha.

O homem que não podia ser já não quer fazer contas, nem se sente muito inteligente por acreditar que trabalhar e honrar compromissos é uma boa forma de viver.

Afinal, se vale tudo…

Nota: Palavras para quê?

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