segunda-feira, 6 de fevereiro de 2012

Os novos pobres: Era uma vez a classe média.


Chegou-me aos ouvidos que, na cidade de Castelo Branco, formou-se um grupo de boas vontades para levar o auxílio mais básico a pessoas carenciadas que viveram as suas vidas integradas na classe média. Sob um rigoroso segredo, estrategicamente, estes cidadãos solidários têm agido de um modo discreto para não dar nas vistas. Trata-se de auxiliar gente de bem que, pelos motivos mais diversos, foram caindo na pobreza e dependência mais absoluta.
Esta situação podemos replica-la pelo nosso país, de norte a sul. Sobretudo, nas grandes cidades. Nos meios rurais de menor dimensão, a habitual solidariedade do nosso povo ainda vai funcionando, para bem dos mais carenciados.
Por outro lado, recentes estudos académicos, revelam-nos que está a surgir um segmento social classificado de "novos pobres". Engloba-se nesta fatia os que têm os vencimentos penhorados, os técnicos desempregados, aqueles que já entregaram as suas casas e automóveis à banca, os que falta verbas para pagarem a internet, a água, a luz e cujas refeições já foram reduzidas ao mínimo dos mínimos.
Trata-se de um tão vasto número de carenciados que já começam a dar nas vistas nos vários meios de comunicação social, pelos responsáveis da Cáritas e da CNIS.
Como sabemos, a classe média em Portugal, ao contrário dos países industrializados da Europa, formou-se ainda muito recentemente em Portugal. A maior parte das pessoas englobadas nesta classe fez a sua ascensão social através dos estudos académicos, com empregos estáveis e garantidos, na aposta na construção civil, pelo jogo fácil na bolsa, pela criação de pequenas e médias empresas prósperas...
Se a ambição de atingir o nível médio do modo de vida europeu galvanizou os jovens da geração pós 25 de Abril, a entrada na União Europeia, a partir dos finais dos anos oitenta, completaria o resto. Nada podia faltar nas casas da classe média adquirida através dos bancos, a juros baixos. O recheio da mesma ia-se juntando ao endividamento. Com apenas um ou dois filhos, os pais e avós trataram os seus filhos e netos como pequenos príncipes. Restaurantes, praia e viagens era sinal de um certo bem estar. Os bancos chegaram a oferecer o dinheiro, a baixo juro, para se fazer férias.
É esta mesma classe média que hoje é posta à prova na manutenção do seu antigo estatuto social numa época de graves restrições. Manter os parâmetros sociais de há duas décadas atrás, tornou-se agora impossível para muita gente. A proletarização do país caminha a passos largos. Sem um desenvolvimento sustentável, para alimentar o nível de vida alcançado, embora de um modo falacioso, nada será possível.
Na semana em que os grandes deste mundo se juntaram em Davos para traçar medidas correctivas da economia mundial, muito pouco ou nada parece surgir dos países ricos a favor dos pobres. Caídos num individualismo feroz, cada um a tentar salvar a sua pele. Se Christine Lagarde,a directora-geral do FMI, com uma cara de aflição, apelou aos líderes europeus para fazerem a sua parte para tentarem resolver os seus problemas financeiros, Berlim parece continuar a resistir a abrir os seus cordões à bolsa.
Com o crescimento no rés - do - chão, a classe média, já mortiça e doente, vai necessitar que olhemos por ela. Envergonhada, a ficar ainda pior do que os da denominada pobreza tradicional que se vai desenrascando com a preciosa ajuda das instituições de solidariedade social, os novos pobres irão sofrer momentos de profunda angústia e solidão se o governo e a sociedade não estiver atenta a estas graves situações sociais.
Por este andar, não faltará muito, que não se diga que "era uma vez" a classe média em Portugal, tal como era conhecida.
florentinobeirao@hotmail.com

Autor: Florentino Beirão - professor

Nota: Era uma vez...

Sem comentários: