Há cinco anos e meio, o então ministro da Economia Manuel Pinho chocou o País quando, numa viagem à China, apresentou os relativos baixos salários portugueses como uma vantagem comparativa de Portugal. Caiu o Carmo e a Trindade.
Há cinco anos e meio, o então ministro da Economia Manuel Pinho chocou o País quando, numa viagem à China, apresentou os relativos baixos salários portugueses como uma vantagem comparativa de Portugal. Caiu o Carmo e a Trindade. Houve quem sublinhasse, e bem, o ridículo de tentar impressionar os chineses com os baixos salários, mas mais relevante para este artigo foram as reacções indignadas contra a aposta nos baixos salários por parte dos partidos de direita.
"São declarações de uma infelicidade extrema e com carácter terceiro-mundista. Penso que só os países do terceiro mundo podem apresentar vantagens competitivas baseadas em baixos salários", disse então o deputado do PSD, Miguel Frasquilho. Em nome do CDS, Diogo Feio lamentou que Portugal fosse apresentado "como uma espécie de paraíso da União Europeia pelo preço da mão-de-obra", realçando que "o factor essencial da competitividade de uma economia não deve ser o preço da mão-de-obra".
Mudam-se os tempos, mudam-se as vontades, e agora a vontade é mesmo recuperar a competitividade através da redução dos custos com o trabalho. A troika assume-o e o ministro das Finanças esta semana também não o escondeu: "A economia portuguesa precisa de ajustar e esse ajustamento depende de uma evolução favorável dos custos unitários do trabalho que permita ganhar competitividade relativamente aos nossos parceiros. Esse processo é inevitável".
O primeiro-ministro tem sido mais contido. Também esta semana Passos Coelho afiançou que "não é política do Governo apostar em nenhuma desvalorização adicional dos salários portugueses. E, portanto, o Governo não está a preparar baixas dos salários em Portugal", disse na sequências das declarações do seu conselheiro António Borges.
Será mesmo assim? Vamos aos factos: no último ano, Passos Coelho reduziu em 20% os salários dos funcionários públicos e as pensões acima de 1.000 euros; baixou a remuneração paga nas horas extraordinárias; cortou nas indemnizações por despedimento; reduziu o subsídio de desemprego (forçando, assim, os desempregados a aceitar salários mais baixos); reduziu dias de férias e feriados, aumentando o número de dias de trabalho para o mesmo rendimento; e prepara-se para limitar as portarias que estendem a todos os trabalhadores de um mesmo sector direitos e actualizações salariais negociados em contratação colectiva.
A esta longa lista junta-se uma das mais relevantes medidas do pacote Impulso Jovem, anunciado na quarta-feira: as empresas que queiram aproveitar ao máximo o apoio do Estado devem pagar um salário bruto de 820 euros (670 euros líquidos). Neste caso, o Estado suporta 21% da remuneração. Se a empresa pagar 1.000 euros, o Estado só financia 17,5%.
Fica mal a um primeiro-ministro que disse ao seu povo que "só vamos sair desta situação empobrecendo" não assumir agora que a redução de salários é um instrumento central do programa de ajustamento para devolver, no curto e médio prazo, competitividade à economia portuguesa. Afinal, de contas é justo que os portugueses conheçam o caminho que estão a trilhar e que percebam que os bons salários que Pinho "vendia" aos empresários chineses vão melhorar ainda mais.
Artigo de: Manuel Esteves.
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